JOSÉ ARAÚJO:”O FUTEBOL DE PRAIA ALGARVIO TEM TUDO PARA CRESCER”

JOSÉ ARAÚJO:”O FUTEBOL DE PRAIA ALGARVIO TEM TUDO PARA CRESCER”

1 Junho, 2023

O Futebol de Praia nacional regressou ao Algarve! Tivemos à conversa com José Araújo, um dos responsáveis pelo projeto do UAC Lagos, o primeiro clube algarvio a criar uma equipa masculina e feminina. Um apaixonado por Futebol de Praia que abordou, entre outros assuntos, o crescimento da modalidade na região e em Portugal.

Futebol de Praia Portugal: O que te levou ao Futebol de Praia?

José Araújo: Antes de mais quero agradecer o convite para esta entrevista. Há muitos anos que o Futebol de Praia Portugal é a referência, em Portugal, para quem gosta desta modalidade. É neste projeto que consigo estar a par de tudo o que se passa, na mesma, por isso é um orgulho poder estar à conversa, sobre Futebol de Praia, nomeadamente o algarvio.

Desde muito novo que me apaixonei por esta modalidade, lembro-me de ter uns 6, 7 anos e esperar que chegasse o Verão para acompanhar o Mundialito e vibrar com a Seleção (pois era a competição que mais relevo tinha nas transmissões televisivas). Na altura, com aquela idade, para mim o Mundialito era a prova mais importante, pois nem sequer sabia da própria existência do Mundial ou da Liga Europeia. Lembro-me que chegava essa altura e até folheava o jornal do meu pai para ver a programação da TVI para saber quando começava.

E essa paixão continuou ao longo da vida, mas sempre do lado de fora. Nos últimos anos, e com a evolução da modalidade em Portugal, pelos clubes onde passei, como treinador de futebol sempre tentei por “o bichinho” para criarmos equipas de futebol de praia, mas sem sucesso. Até que chego ao UAC Lagos como Coordenador Geral.

FPP: O UAC Lagos foi a primeira equipa do Algarve a ter uma equipa masculina e feminina nos respetivos campeonatos nacionais. Porquê essa aposta dupla, ainda para mais em ano de estreia?

JA: O Projeto do UAC Lagos foi sempre assente em três pilares: uma forte aposta no Desporto Feminino, no Desporto Adaptado, e apenas e só desenvolver modalidades que não existem no concelho. Nós nunca quisemos rivalizar com os clubes da terra, mas sim fornecer à população modalidades que poderiam querer praticar mas que não tinham. Também é importante referir que sempre vimos os clubes da região como possíveis parceiros. Como Coordenador Geral tinha a oportunidade perfeita para poder avançar com a criação desta modalidade na nossa Região.

Contudo e, devido ao um dos nossos pilares, nunca quisemos ter uma modalidade apenas e só no masculino, então tínhamos que avançar obrigatoriamente com o feminino. Estava fora de questão qualquer outra realidade por isso metemos mãos a obra!

FPP: Além de jogador que papel tiveste nas equipas?

JA: Dentro de campo fui jogador da equipa masculina e fora dele fui treinador da equipa feminina. Fui um dos responsáveis por toda a logística e planeamento, o então chamado “trabalho invisível”, para não faltar nada e para cumprirmos com tudo aquilo que queríamos.

FPP: Como classificas o teu trabalho no final do projeto?

JA: Antes de mais, eu não posso ficar com todo o crédito pela história que fizemos. O que se alcançou, foi só possível com toda a ajuda que tivemos, seja por exemplo, a Câmara Municipal de Lagos e a Junta de Freguesia de São Gonçalo de Lagos, o treinador Luis Moreira (treinador da equipa masculina) que se mostrou logo disponível para ser treinador, para me libertar essa função e poder jogar. Os jogadores e as jogadoras que se sacrificaram muito por esta modalidade e pelo clube, a Associação de Futebol do Algarve e todos os responsáveis pelos clubes. A Federação Portuguesa Futebol, em especial ao Madjer que durante os 2 meses nos ajudou em tudo, para que o Algarve tivesse uma equipa feminina a competir no Campeonato Nacional. A todos os clubes que nos ajudaram, o CD de Odiáxere, AD Fazendense, CF Esperança de Lagos, entre outros. Por fim, e mais importante de todos, o meu braço direito em todo o projeto do Futebol de Praia do clube, a Presidente do UAC Lagos Beatriz Nazário, que tudo fez para que não faltasse nada.

Nós fizemos história! Fomos a primeira equipa da história algarvia a participar no Campeonato Nacional Feminino e uma das quatro pioneiras no Futebol de Praia masculino. Isto foi possível graças a um trabalho enorme por parte de todos, e com a ajuda de todos. Na altura era treinador do CD de Odiáxere e eles prontamente ajudaram-nos. Permitiram que vários jogadores, da equipa de Futebol, viessem jogar por nós, na areia, sem essa ajuda não teria sido possível.

A própria presidente, que conhecia muita gente, conseguiu ir buscar jogadores a outras equipas para jogarem por nós. Depois, fomos em busca das jogadoras, tínhamos jogadoras desde Sagres até Faro. Tínhamos jogadoras de Santarém, antigas jogadoras minhas que prontamente marcaram presença para nos ajudar. Para primeiro ano, a equipa feminina, sempre a jogar com poucas jogadoras, fizeram frente a muitas equipas. Fomos os únicos a estar a vencer por dois golos diante da formação que viria a ser campeã nacional.

A equipa masculina demonstrou uma boa qualidade, em maioria dos jogos do campeonato, e ainda chegou à segunda eliminatória da Taça de Portugal, caindo apenas e só nos penaltis.

Mais importante que os resultados desportivos foi o ambiente vivido, o respeito que tínhamos por parte das outras equipas, que sabiam o esforço desumano que tivemos em prol da modalidade, o fair play que demonstramos, na qual recebemos dois cartões brancos, foram as nossas maiores vitórias.

O Futebol de Praia algarvio terá que agradecer sempre ao UAC Lagos por tudo o que fizemos em prol do mesmo. Como disse, com pouco fizemos muito, e provámos que era possível, com vontade e trabalho, de ter equipas masculinas e femininas a competir e a levar o nome do Algarve a Portugal inteiro.

FPP: Como avalias o Futebol de Praia no Algarve? O que é necessário para continuar a crescer?

JA: O Futebol de Praia algarvio acordou tarde, mas ainda vai a tempo de ser uma referência no panorama nacional. Talvez somos a zona de Portugal com melhores condições para a prática da modalidade, condições climatéricas favoráveis ao longo do ano, e um extenso areal de uma ponta a outra do Algarve. Por isso tem de haver uma forte aposta no seu desenvolvimento, e os clubes tem de ter uma palavra a dizer. Têm um dever moral de tentar fazer mais. Das quatro equipas pioneiras, do Futebol de Praia, o UAC Lagos, o AD Tavira Praia, o CDR Quarteirense e o Instituto D. Francisco Gomes/Relógio, só uma é que tinha uma estrutura grande, organizada e estruturada. Isto prova que se as outras três, com poucos recursos conseguiram fazer, qualquer clube algarvio, seja de grande ou pequena dimensão, pode apostar nesta modalidade. Numa altura em que o Futebol e o Futsal estão parados os jogadores e as jogadoras continuam sedentas de “bola”.

A procura e o interesse por parte de jogadores e jogadoras existe, e cada vez mais, porque todos os jogadores/as que jogaram no ano passado têm interesse em jogar de novo, e eles/as próprios/as aliciam novos praticantes, por isso o próximo passo é sem dúvida, haver mais oferta para os possíveis interessados em participar.

Agora, o Futebol de Praia algarvio tem tudo para crescer. A presença do AD Tavira, liderado pelo campeão mundial, por Portugal, o grande Pedro Crespo, no Campeonato Nacional é importantíssima, pois é a única equipa em contexto Nacional que poderá demonstrar toda a qualidade do Futebol de Praia algarvio. O interesse de novos clubes em participar no campeonato distrital deste ano, é uma boa noticia para nós.

Por fim, e o mais rápido possível, é importante o Algarve voltar a ter pelo menos uma equipa de Futebol de Praia Feminino, porque a história que o UAC Lagos, e todos nós fizemos no ano passado, só interessará se houver continuidade, porque as jogadoras e as raparigas do Algarve merecem, e tem qualidade. Basta ver que no ano passado tivemos uma jogadora algarvia a ir a um estágio da Seleção Nacional, e este ano corre o risco de nem sequer competir na modalidade. A Cristiana Cruz, jogadora do UAC Lagos que foi à Seleção Nacional é a prova que as jogadoras de Futebol e de Futsal, que cresceram com o sonho de chegar às Seleções, mas que nunca conseguiram, o poderão cumprir no Futebol de Praia.

FPP: O areal algarvio já presenciou a grandes competições de Seleções, achas que é importante voltar a esses momentos para continuar a evoluir?

JA: Portimão foi capital do Mundialito durante anos, na altura o estádio enchia, e a praia esvaziava, todos queriam ver. Nos meses de Verão, onde o Algarve se enche de turistas nacionais e internacionais, fazia todo o sentido termos de volta grandes provas nacionais e internacionais. Este ano, mais uma vez, o Campeonato Nacional de Futebol de Praia Universitário foi realizado no Algarve, o que já foi muito bom, mas precisamos de mais. Porque agora é que começam a aparecer clubes no Algarve para a prática da modalidade, se conseguirmos trazer os melhores dos melhores para cá, mais clubes e mais jogadores terão interesse em participar.

FPP: A nível nacional como vês o Futebol de Praia em Portugal?

JA: Vejo com agrado a evolução das competições em Portugal. Quem acompanha há muitos anos o Futebol de Praia, sabe o quão tem sido enorme a evolução das competições em Portugal. Chegámos a ter dois campeonatos em simultâneo, mas o passado já lá vai, e entrada e aposta da FPF nesta modalidade foi essencial.

Este ano tanto o Campeonato Elite, como o Campeonato Nacional começam mais cedo, algo que certamente poderá prejudicar as equipas amadoras, uma vez que a grande maioria dos seus jogadores não são profissionais de Futebol de Praia, e ainda estarão a jogar nos seus clubes, seja de Futebol, seja de Futsal. Acho que isso é o único ponto negativo, porque muitos e grandes jogadores que poderão mais cedo ou mais tarde fazer vida do Futebol de Praia, não estarão presentes na maioria da competição, ou até mesmo desistirem da modalidade devido a essa razão. Poderemos perder grandes atletas.

Estou muito curioso para ver como corre esta época desportiva, uma vez que vamos ter mais equipas e mais competições, na qual pela primeira vez vamos ter regionais. A existência de uma “terceira divisão”, que são os regionais, é importante para novos clubes poderem começar a modalidade, uma vez que os custos serão muito inferiores ao Campeonato Elite e mesmo ao Campeonato Nacional.

No que toca ao feminino, vamos para o terceiro ano oficial de Campeonato Nacional, onde se espera que mais equipas comecem a atividade, e onde as que já tem há vários anos, continuam a apostar forte no recrutamento e retenção de jogadoras. Acho que vai ser um campeonato muito positivo. O próprio campeonato ao ser por zonas facilita os clubes desportivos na sua sustentabilidade. Acredito que o próximo passo seja, a criação da Taça de Portugal e da Supertaça, algo que iria dar ainda mais visibilidade as jogadoras e clubes.

E aí temos que fazer um agradecimento à FPF e a todos os intervenientes, por criarem competições sustentáveis, bem organizadas e competitivas.

A visibilidade este ano tem sido menor, até ao momento, uma vez que no Canal 11 só transmitiu a Supertaça, em direto, mas acredito que no Verão isso mude, e possamos acompanhar o Futebol de Praia na televisão, algo que é essencial para a evolução da modalidade.

FPP: Onde te podemos ver neste 2023?

JA: Este ano, devido à minha situação profissional, tive que sair do UAC Lagos. Porém, e devido à paixão pelo Futebol de Praia ser enorme, sinto que posso continuar a dar algo mais, não enquanto jogador, mas sim como potenciador desta modalidade na nossa região. Obviamente que não iria conseguir ficar de fora. Juntar-me-ei ao grande Eduardo Barão que lidera o Instituto Francisco Gomes/Relógio, uma das quatro equipas pioneiras, e irei ajudar dentro de campo, e especialmente fora dele, para juntos continuarmos a escrever a história do Futebol de Praia algarvio.